Não!
Ninguém que tenha vivido uma vida na igreja simplesmente resolve sair e não mais acreditar. Ninguém decide tirar o chão dos seus pés ou abrir mão de suas certezas e esperanças.
Não, não é de propósito que o cérebro se abre, não procuramos dar uma espiadinha lá fora e tudo acontece...sempre ouvimos dizer que seria melhor não pensar muito sobre determinadas coisas, pois seria perigoso demais, correríamos o risco, então não ousamos nem tentar. Pois essa verdade que sempre acreditamos de todo o coração, mesmo sendo tão forte, seria frágil se confrontada ou questionada. (Claro que nunca nos falaram assim).
O Espírito tão poderoso e forte, capaz de nos proteger de tudo, de nos dar um testemunho e uma certeza maior do que visões ou presenças físicas de seres celestiais, poderia se tornar frágil se ouvíssemos coisas contrárias ao que sabíamos e não nos protegeria o suficiente...
Por isso nunca pretendemos saber de coisas “lá fora”. Falo isso por mim e por quem mais se identificar.
Não tomei a decisão de sair da igreja, isso nunca foi uma possibilidade ou uma opção para mim. Eu sabia que deveria seguir em frente, rumo a eternidade, esse era meu objetivo. Estava lendo o Livro de Mórmon todos os dias, orando, fazendo tudo certinho como sempre, ou pelo menos tentando. Acreditando e confiando na veracidade da igreja, que era a única coisa que me importava.
Decepção com membros? Quem nunca experimentou? Mas isso para mim era nada. Nunca foi obstáculo. Eu queria estar acima de tudo o que via, procurava pensar em Cristo, na perfeição do evangelho, isso me bastava.
Muitos chamados? Sempre. Nunca me cansei deles, servia por amor, na intenção de apoiar as famílias e não esperando apoio. Entendia isso muito bem, que estava servindo para Deus ao ajudar meus irmãos.
Dúvida com doutrinas? Nunca tive um pingo de dúvida sobre nada. Pois eu confiava que Deus havia chamado um profeta nos últimos dias e que tudo o que provinha dele, era verdadeiro.
Testemunho? Eu tinha sim. Porque eu sempre estive ali, nos momentos convenientes e inconvenientes, muitas e muitas vezes, de corpo e alma, e quem pode dizer ao contrário?
Eu tinha um testemunho da obra que eu conhecia, daquilo que eu acreditava ser a verdade, do jeito que havia sido apresentada a mim. Eu sentia ser verdade o que eu havia aprendido porque tudo fazia sentido, da forma mais pura e linda que foi me apresentada e nunca alterada. Pois se uma história é verdadeira, se um fato é verdadeiro, será para sempre. Nunca imaginei que de repente, poderia não ter sido bem assim. Nunca.
Boatos sobre a igreja? Nunca me abalaram, ouvia muitas coisas vindas de familiares e amigos que não eram membros mas sempre aprendi que eram apenas palavras de pessoas maldosas querendo destruir a obra de Deus pela influência de Satanás.
Meu vínculo era forte, minha entrega total. A igreja era minha vida.
Mas eu senti um click nesse ano de 2020. Esse click veio para mim, eu não o busquei. Como disse no início, ninguém busca um momento assim. É triste saber de fatos por tanto tempo escondidos, perceber coisas que por anos não percebíamos. Já falei bastante sobre isso no meu primeiro desabafo.
Tenho percebido que por causa desse click na mente, que nos permite pela primeira vez pensar sobre Deus, sobre o que Ele faria ou permitiria e com qual intenção... por causa disso é que começamos a enxergar tudo, percebemos tudo e nada mais pode ser como antes, ou seja, não conseguimos permanecer.
Não. Não há ninguém que desperte e saia feliz e sem sequelas da igreja. É assustador. Nos sentimos angustiados, frustrados, tristes, inconformados, revoltados, indignados. Sem contar que somos desprezados, ignorados, incompreendidos...e ainda temos o medo e a incerteza que no princípio é dominante. A sensação de termos vivido uma vida toda inconsciente. Quem desejaria passar por isso?
Então, não somos culpados se enxergamos coisas que outros não enxergam. E não merecemos ser julgados. Não estamos loucos e o inimigo não nos domina. Tudo o que vivemos valeu a pena, mas fomos enganados. Fomos fieis a igreja mas a igreja não foi fiel a nós. E a partir disso percebemos como tudo ocorre lá dentro desde o princípio, o que é uma triste novidade para nossa mente e coração.
Digo por mim, que é um luto, um divórcio, algo que eu não estava preparada para enfrentar. Deixo doer, para ser curada. Um dia a dor vai embora, assim como todas as feridas da alma.
Precisamos seguir em frente, em respeito a essa nova vida que nos espera, com a oportunidade única de sermos nós mesmos. Acreditando no que nossa alma deseja, sendo felizes do nosso próprio jeito e principalmente, não sermos mais controlados, mas seguirmos nossa vida em paz, vivendo da nossa própria essência e fé.
E aliás, continuo minha jornada eterna.
Comentários
Postar um comentário